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segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

8.4. Dr. Harry M. Tiebout (1896-1966)

Grapevine, Julho de 1966.
 Por Bill W.

           

Quando este número da Grapevine chegar aos seus leitores, todas as pessoas de A.A. já terão tomado conhecimento do falecimento do nosso muito querido amigo, o Dr. Harry M. Tiebout, psiquiatra, o primeiro da sua categoria a apresentar-nos para todo o mundo. Seus dons, um exemplo valoroso, sua profunda compreensão das nossas necessidades e trabalho constante em favor da nossa Irmandade têm sido – e sempre serão, de um valor incalculável.
            Começou assim: estávamos no começo do ano de 1939 e o livro Alcoólicos Anônimos estava a ponto de ser impresso. Para nos ajudar a fazer as últimas correções do livro, havíamos distribuído várias cópias mimeografadas do manuscrito. Uma cópia foi parar nas mãos de Harry. Embora grande parte do conteúdo estivesse então contra suas próprias ideias, leu o nosso livro com grande interesse. E o que foi ainda mais importante, após ler o livro, resolveu mostra-lo a um par de seus pacientes, que agora conhecemos como Marty e Grenny. Eram dois de seus pacientes mais difíceis e aparentemente desajuizados. A princípio, o livro causou-lhes pouca impressão. De fato, o uso frequente da palavra “Deus” enfureceu tanto Marty que pegou o livro e o jogou pela janela, foi-se embora aborrecida do elegante sanatório onde se encontrava e se atirou numa tremenda bebedeira.
            Grenny não foi tão longe com sua rebeldia; acolheu o livro friamente. Quando finalmente Marty voltou a apresentar-se, tremendo violentamente, perguntou para o Dr. Harry o que poderia fazer agora, ele simplesmente sorriu-lhe e disse: “É melhor que volte a ler esse livro”. De volta para seu quarto, Marty resolveu folhear o livro mais uma vez. Uma frase em especial chamou sua atenção: “Não podemos viver com ressentimento”. Assim que pode aceitar esta ideia sentiu-se cheia de “uma experiência espiritual transformadora”.
            Imediatamente, assistiu a uma reunião. Aconteceu na Rua Clinton, onde vivíamos Lois e eu. De volta à Blythewood, encontrou a Grenny cheia de curiosidade. Estas foram as primeiras palavras que lhe dirigiu: “Grenny, já não estamos mais sozinhas”.
            Este foi o começo da recuperação de ambas – recuperações que perduram até hoje. Ao ver estes acontecimentos, Harry ficou maravilhado. Apenas uma semana antes, as duas haviam resistido obstinadamente a todos os seus métodos. Agora falavam e o faziam abertamente. Para Harry, esta era a realidade – a nova realidade. Por ser um cientista e homem de valor, Harry não vacilou, nem por um momento, em reconhecer este fato. Colocou de lado suas próprias convicções a respeito do alcoolismo, sob suas manifestações neuróticas, e, rapidamente, se convenceu de que em A.A. existia algo, talvez algo muito importante.
            Durante todos os anos posteriores, muitas vezes colocando em risco sua posição profissional, Harry continuou dando respaldo a A.A. Tendo em conta sua posição profissional, isso requeria um grande sacrifício.
            Permitam-me que compartilhe com os senhores, alguns exemplos concretos. Em um de seus primeiros pronunciamentos médicos, aquele famoso respeito à “Rendição”, declarou que o processo de diminuir o ego não só era o básico dos princípios de A.A., como também, absolutamente fundamental, na prática da psiquiatria. Esta atitude requeria tanto humildade como conhecimento. Será sempre um ilustre exemplo para nós.
            Não obstante, isso era um mero começo. Em 1944, com a ajuda do Dr. Kirby Collier de Rochester e Dwight Anderson de Nova York, Harry havia persuadido à Sociedade Médica Norte Americana do Estado de Nova York a permitir que eu, um leigo, lesse um pronunciamento sobre A.A. em sua reunião anual. Cinco anos mais tarde, o mesmo trio, novamente encabeçado por Harry, persuadiu a Associação de Psiquiatria Norte Americana a me convidar a ler outro pronunciamento – nessa ocasião, ante a sua Reunião Anual em Montreal em 1949. A.A. tinha então uns cem mil membros e muitos psiquiatras já haviam visto de perto o impacto que causávamos em seus pacientes.
            Para nós AAs que estivemos presentes nesta reunião, foi um momento muito emocionante. A minha apresentação seria sobre “a experiência espiritual”, segundo o ponto de vista de A.A. Certamente, ninguém levou a sério! Para nosso grande espanto, o pronunciamento foi muito bem aceito – ao menos, a julgar pelos muitos aplausos.
Em seguida, se aproximou de mim, um distinto cavalheiro, Apresentou-se como um dos ex-presidentes da Associação de Psiquiatria Norte Americana. Com grande entusiasmo, disse-me “Sr. W. é bem possível que eu seja o único entre meus colegas aqui presentes que realmente acredita na ‘experiência espiritual’ do mesmo modo que o senhor. Em certa ocasião, eu mesmo tive um despertar muito parecido com o seu, uma experiência que tive em comum com dois amigos íntimos, Bucke e Whitman”.
            Naturalmente, perguntei-lhe: “Mas, porque parece que seus amigos gostaram do pronunciamento?”. Replicou-me algo como: “Olhe, nós psiquiatras sabemos o quão difíceis são os senhores, os alcoólicos. O que comoveu a meus colegas não foram as afirmações que o senhor fez em seu pronunciamento. mas o fato de que A.A. pode levar a sobriedade aos alcoólicos em grande número".
            Visto dessa forma, sentia-me ainda mais profundamente comovido pelo magnífico e generoso tributo que se havia prestado a A.A. Sem demora, meu pronunciamento foi publicado na Revista de Psiquiatria Norte Americana e a nossa sede de Nova York foi autorizada pela Associação para fazer e distribuir todas as cópias que desejássemos. Nessa época, A.A. já havia começado a se difundir no exterior. Só Deus sabe o quanto esse artigo, ao ser reproduzido por nós e presentado aos psiquiatras de países distantes pelos Grupos de A.A. recém-formados, acelerou enormemente a aceitação mundial de A.A.
            Poderia continuar falando sem parar a respeito de Harry, contando-lhes as suas atividades no campo global do alcoolismo, de seu marcante serviço em nossa Junta de Custódios. Poderia contar-lhes da nossa grata amizade, recordando, particularmente, seu bom humor e seu riso contagioso. Mas o espaço que me foi destinado é muito pequeno.
Transcrito do livro “A Linguagem do Coração”, pag. 433 a 435. Junaab, código 104.
Veja mais em:
http://www.silkworth.net/tiebout/tiebout_papers.html
http://en.wikipedia.org/wiki/Harry_Tiebout


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