Box 4-5-9, Abril-Maio 2004 (pag. 1-2) =>
http://www.aa.org/newsletters/en_US/en_box459_april-may04.pdf
Título original: “Singleness of Purpose".
"Nossa Unicidade de Propósito –
A pedra angular de A.A. (*)", foi o tema da Conferência de Serviço Gerais do ano
de 2004 e destaca um dos principais
objetivos que a Irmandade manteve durante quase 70 anos em que ofereceu um
refúgio seguro para os alcoólicos que sofrem. Desde aquela tarde de maio de 1935 quando Bill W. e o Dr. Bob se conheceram e conversaram durante horas
seguidas, bêbados tem-se reunido para compartilhar suas experiências forças e
esperanças, com um único propósito: para ajudar a si próprios e a outros
alcoólicos a se recuperar através Doze
Passos da A.A. Durante a semana de 18 a 24 de abril de 2004, os membros da Conferência irão reexaminar nossa unicidade de
propósito – sua base espiritual e os desafios que a Irmandade enfrenta hoje.
Eles vão tratar de temas como a responsabilidade para com o recém-chegado,
salvaguardas da nossa unidade e o papel do grupo local; também irão participar
de um seminário sobre a importância da unicidade de propósito para o indivíduo,
Grupo, Distrito, Área, Grapevine (no
Brasil a Revista Vivência), e ESG.
As Tradições, Terceira e Quinta,
afirmam claramente: “Para ser membro de
A.A., o único requisito é um desejo de parar de beber" e, "Cada Grupo é animado de um único
propósito primordial: o de transmitir sua mensagem ao alcoólico que ainda
sofre”. A.A. é para alcoólicos e pessoas que acreditam ter problemas com
sua maneira de beber; como Irmandade temos um único objetivo que é o de
compartilhar nosso programa de recuperação com outros alcoólicos. Entretanto,
A.A. como um todo, membros e Grupos, têm encontrado obstáculos quando pretendem
se ater unicamente a estes princípios básicos e essenciais de nossas Tradições.
Todas as Doze Tradições foram
forjadas durante anos de tentativas e erros e, na maior parte, foram
concebidas, não pela sabedoria de seus fundadores e pioneiros, mas pelo
reconhecimento destes da necessidade de salvaguardas contra seus próprios
defeitos de caráter. Nos primeiros anos da formação da Irmandade, seus
primeiros membros pretendiam canalizar suas energias para a criação de
hospitais, centros de educação sobre o álcool e outros projetos grandiosos.
Entretanto, essa ânsia por grandiosidade vinha acompanhada pelo medo de perder
a sobriedade recém-descoberta. No livro Doze Passos e Doze Tradições (pg.
125/126, no Brasil), Bill W. escreveu “Em
dada época, cada Grupo de A.A. tinha numerosas regras de ingresso. Todos temiam
que alguém ou alguma coisa fizesse virar o barco, atirando todos de volta à
bebida. O Escritório da nossa Fundação pedia a cada Grupo que enviasse sua lista de regras
‘protetoras’. A lista total era quilométrica. Se todas aquelas regras
vigorassem realmente em toda parte, ninguém teria conseguido ingressar em Alcoólicos
Anônimos, tal a extensão da nossa ansiedade e dos nossos temores. Estávamos decididos a admitir a entrada em
A.A.; apenas daquelas pessoas a quem chamávamos de ‘alcoólicos puros...Isso
agora talvez pareça cômico... Bem, tínhamos medo...Afinal, não será o medo a
verdadeira base da intolerância?... Como poderíamos então adivinhar que todos
aqueles temores resultariam infundados“.
Mais de meio século depois, essas
palavras ainda parecem não ser tão cômicas assim. Com o afluxo de futuros
membros que sofrem de outros problemas, nossa fé em que esses temores são
infundados é testada diariamente. Como A.A. tornou-se cada vez mais conhecido e
respeitados aos olhos do público, muitas outras organizações adotaram nossos
Doze Passos de recuperação para uma ampla variedade de problemas e adições.
Isso resultou numa distorção na distinção entre A.A. e outras instituições – "o álcool também é uma droga",
podemos ouvir dos recém-chegados que não são alcoólicos, mas – muitas vezes
informados por bem-intencionados amigos de A.A, acreditam que as reuniões de
A.A. são o lugar mais adequado para aqueles com qualquer problema ou adição.
As orientações para essa situação
estão claras em um artigo que Bill W. escreveu na revista Grapevine, em
fevereiro de 1958, com o título "Outros problemas além do álcool,"
(disponível nos ESL´s com o código 220): "Nossa
primeira responsabilidade como Irmandade, é a de garantir nossa própria
sobrevivência. Portanto, temos que evitar confusões e as atividades de
propósitos múltiplos.... Sobriedade – libertação do álcool – através da
aprendizagem e da prática dos Doze Passos, é o único propósito de um Grupo de
A.A..... Temos de limitar nossa Irmandade aos alcoólicos e também limitar os
nossos Grupos de A.A. a um único propósito. Se não nos agarrarmos a esses
princípios, certamente fracassaremos. E se fracassarmos, não poderemos ajudar
ninguém”.
Como lidar com alcoólicos com outras adições
(dependência cruzada, no Brasil) que persistem em falar sobre outros problemas
nas reuniões é uma questão diferente. No mesmo artigo, Bill escreve sobre "um dos melhores AAs que conheço é um
homem que esteve sob a dependência da agulha sete anos antes de se juntar a
nós. Mas, antes da dependência da droga, ele tinha sido um alcoólico ativo e
sua história comprovou isso. Portanto tinha o requisito para tornar-se membro
de A.A., e passou a ser um de nós”. Devem insistir os Grupos em que os
recém-chegados, portadores de dupla dependência, limitem seus depoimentos
unicamente ao seu alcoolismo? Os Grupos
deverão exigir dos futuros membros a identificação de sua principal dependência
antes de aceitá-los como ingressantes? Ou, simplesmente podemos acolher e
saudar estes homens e mulheres na confiança de que virão, ouvirão e irão
encontrar seu próprio caminho?
Na Conferência de 1983, cujo tema foi “Estamos ajudando o portador de dependência
dupla?”. A delegada Dyanne G. descreveu a forma como seu Grupo lhe deu as
boas-vindas “Agradeço a Deus por ter
ingressado num Grupo amadurecido e suficientemente espiritualizado onde não
encontrei nenhuma censura aos meus depoimentos e ações a fim de (meus
companheiros), se protegerem de mim. Eu falei sobre drogas, e usei um monte de
palavrões ao fazê-lo! O Grupo me tratou com a dignidade suficiente para eu
poder escolher mudar estas coisas e a liberdade para fazê-lo quando eu pudesse,
não quando eles achavam que eu deveria. O meu Grupo parece não ter nenhuma
dificuldade em lidar com o nosso único propósito, que é o de levar a mensagem
aos alcoólicos ainda sofrem. Entretanto, no começo foi um pouco confuso. Há uma
linha tênue entre defender nossa Tradição de unicidade de propósito e limitar
ou restringir a adesão de membros. O dia em que A.A. comece a rejeitar as
pessoas que podem ser alcoólicas começaremos a morrer. Onde fica a nossa boa
vontade se, para defender nossos ‘direitos’, destruímos A.A.?”
Unicidade de propósito tem sido o
tema de várias Conferências anteriores, e praticamente em todas e cada uma das
discussões e ações de assessoramento relacionadas com esse assunto tomaram
muitas horas. A Conferência de 1987
debateu por quase um dia inteiro uma recomendação para a aprovação pela
Conferência de uma instrução para diferenciar reuniões abertas e fechadas
sugerindo que "ao discutir nossos
problemas, nos limitemos unicamente aos problemas que se referem ao
alcoolismo." Alguns alegaram que nenhum Grupo tem o direito de dizer a
ninguém o que falar; outros pediram ajuda para lidar com pessoas com outras adições
e que estavam dominando reuniões. Os procedimentos de votação normais foram
suspensos e por varias vezes foram recontados os votos favoráveis e contrários
à proposta, até que todos se satisfizeram por ter alcançado uma verdadeira
consciência de Grupo. No final, a Conferência, com substancial unanimidade
votou contra a aprovação da proposta, mas criou uma peça de orientação
conhecida como “Blue Card” (Cartão
Azul) disponível para os Grupos que desejam essa orientação (**).
Os adictos e pessoas com outras
dependências não contempladas pela unicidade de propósito de A.A. não irão desaparecer
– eles são uma das consequências do nosso próprio sucesso. Ironicamente, alguns
dos nossos bons amigos no campo do alcoolismo agravam o problema porque eles
acreditam que o nosso programa funciona melhor do que qualquer outra coisa para
uma variedade de adições. Informação pública e um bom trabalho de cooperação
com profissionais é parte da resposta, mas, em última análise, não podemos
controlar o que outros fazem – apenas como nós mesmos iremos reagir. Se, na
defensiva, respondemos com uma enxurrada de restrições, não estaremos saindo de
nosso propósito ao impedir a participação de alcoólicos que ainda não
reconheceram se problema?
No encerramento da 36ª Conferência de
Serviços Gerais em 26 de abril de 1986,
no Hotel Roosevelt em Nova York, Bob Pearson (1917-2008), deu uma poderosa e inspiradora palestra de
encerramento. Bob P. foi Gerente Geral do Escritório de Serviços Gerais (GSO),
em Nova York, entre 1974 e 1984 e depois serviu como conselheiro
sênior para o GSO, de 1985 até sua
aposentadoria. Foi um momento especialmente significativo, pois sabia que iria
se aposentar no ano seguinte, e que esta seria sua última Conferência de
Serviços Gerais. “Faço eco aqueles que
sentem que, se a Irmandade um dia vier hesitar ou falhar, não será por causa de
qualquer causa externa. Não, não será por causa de centros de tratamento ou de
profissionais da área, ou da literatura não aprovada pela conferência, ou dos
jovens, ou dos portadores de dependências cruzadas, nem até mesmo dos usuários
de drogas tentando assistir às nossas reuniões... Será porque não podemos controlar
nossos próprios egos e porque somos incapazes de conviver bem uns com os
outros. Será porque temos muito medo e insegurança, rigidez, falta de confiança
e de bom senso?
Se você me perguntasse qual é o maior perigo enfrentado por A.A. hoje,
eu teria que responder: a rigidez crescente - a demanda por respostas absolutas
para minúcias; a pressão sobre o GSO para ‘reforçar’ as
nossas tradições; a triagem de alcoólicos em reuniões; a proibição de
literatura não aprovada pela Conferência; o estabelecimento de mais e mais
regras para controlar os grupos e seus membros. Esta tendência à rigidez está
nos afastando cada vez mais dos nossos membros fundadores. Bill, em particular,
deve estar dando voltas em seu túmulo, pois ele foi talvez a pessoa mais
permissiva que eu já conheci. Uma de
suas frases preferidas era: ‘Cada grupo tem o direito de estar
errado’. Ele era irritantemente tolerante com seus críticos e tinha fé absoluta
na capacidade de AA se autocorrigir”.
(*) N.T.: Pedra angular
(ou fundação de pedra) é a primeira pedra no conjunto na construção de uma
fundação de alvenaria, importante, pois todas as outras pedras serão definidas
em referência a essa pedra, determinando assim a posição de toda a estrutura.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedra_Angular
(**) PARA SABER MAIS:
N.T.:
A Conferência de 1987 (EUA/Canadá)
criou uma declaração de propósito e o ESG tornou disponível para os Grupos que quiserem
utilizá-lo, um cartaz que ficou conhecido como Blue Card ou, Cartão Azul, com o código F-17. (abaixo,
à esquerda). Seu texto:
“Esta
é uma reunião ABERTA de Alcoólicos
Anônimos. Estamos contentes por vocês terem vindo, especialmente os
recém-chegados. De acordo com nossa unicidade de propósito e nossa Terceira
Tradição que afirma que ‘Para ser membro de Alcoólicos
Anônimos, o único requisito é o desejo de parar de beber’, pedimos a todos os participantes que limitem os comentários a seus
problemas com o álcool”.
“Esta
é uma reunião FECHADA de Alcoólicos
Anônimos. Em conformidade com a singeleza de propósito de A.A., a participação
em reuniões fechadas está limitada às pessoas que têm o desejo de parar de
beber. Se você acha que tem têm problemas com o álcool, você está convidado a
participar desta reunião. Pedimos que, ao discutir os nossos problemas, nos
limitemos unicamente aos que dizem respeito ao alcoolismo”.
http://home.capecod.net/~action-12steps/spur/bluecard.html
A Conferência de 1997 aprovou uma definição revisada da declaração da Unicidade de
Propósito de A.A. que oferece uma possível solução para pessoas com outros
problemas que queiram se tornar membros de A.A.: "O alcoolismo e a drogadicção podem ser classificados como 'abuso
de substâncias químicas' ou como 'dependência
de substâncias químicas'. Por
conseguinte, às vezes se permite, em A.A., tanto a introdução dos não
alcoólicos como a dos alcoólicos e lhes é feita a recomendação de que assistam
às reuniões. Qualquer pessoa pode assistir às reuniões abertas de A.A. Mas
unicamente os que têm um problema com a bebida podem assistir às reuniões
fechadas ou tornarem-se membros de A.A. As pessoas que têm outros problemas
diferentes do alcoolismo podem se tornar membros de A.A. somente se tem um
problema com a bebida".
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